Com o crescimento das redes sociais como fontes de informação, uma série de conteúdos relacionados à saúde e comportamento humano começou a ganhar popularidade. Entre essas postagens, muitos trazem diagnósticos simplificados, como o exemplo de uma postagem que afirma que a dificuldade de dormir cedo e as mudanças de energia ao longo do dia são sinais claros de TDAH (Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade). Embora as redes sociais possam ser uma ferramenta útil para compartilhar conhecimento, é importante reconhecer os perigos de se basear unicamente nesses conteúdos para autodiagnósticos.

Sintomas simplificados e o risco de autodiagnóstico

A postagem em questão, por exemplo, ilustra de forma gráfica como o ciclo de energia de uma pessoa ao longo do dia — desde acordar cansado pela manhã, sentir sonolência à tarde, até um pico de energia à noite — pode estar relacionado ao TDAH. No entanto, esse padrão de comportamento pode ser observado em diversas condições e situações, muitas das quais não têm relação com o transtorno.

Alterações no ciclo circadiano (relógio biológico) podem levar a esses mesmos comportamentos. Pessoas que têm hábitos noturnos ou que trabalham em turnos alternados frequentemente relatam sentir-se cansadas ao longo do dia e, paradoxalmente, mais alertas à noite. Outro fator que pode influenciar é o uso excessivo de redes sociais e eletrônicos, que pode atrasar a liberação de melatonina, prejudicando o sono e causando fadiga diurna.

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Fatores que podem imitar sintomas de TDAH

Além do ciclo circadiano desregulado, diversos fatores podem desencadear sintomas semelhantes ao TDAH. Entre eles:

– Ansiedade: O cansaço matinal e a dificuldade de manter o foco podem ser sintomas de ansiedade, um transtorno bastante comum que afeta o sono e o nível de energia.

– Superdotação e aceleração: Crianças e adultos com superdotação cognitiva podem apresentar comportamentos que se assemelham aos do TDAH, como inquietação, dificuldade de concentração em atividades monótonas e horários de sono desregulados, especialmente quando há falta de estímulos adequados.

– Autismo: Indivíduos no espectro do autismo podem ter padrões de sono alterados e enfrentar desafios para regular seus níveis de energia ao longo do dia.

– Cultura e estilo de vida: Diferentes culturas e rotinas diárias, incluindo a prática de longas jornadas de trabalho ou estudo, podem causar cansaço e uma sensação de esgotamento. Em muitos casos, pessoas que seguem rotinas intensas durante o dia apresentam picos de energia à noite, quando finalmente encontram tempo para descansar.

– Excesso de uso de redes sociais e eletrônicos: O uso prolongado de dispositivos eletrônicos, especialmente antes de dormir, pode interferir nos padrões de sono e contribuir para a sensação de exaustão matinal e vigília noturna.

Redes sociais: o cuidado ao interpretar conteúdos

Postagens como essa podem levar muitas pessoas a acreditarem que estão vivendo com TDAH, o que pode aumentar o risco de autodiagnóstico e, em alguns casos, até de automedicação, algo extremamente perigoso. Na realidade, essas postagens raramente oferecem uma explicação completa e, mais preocupante, não consideram o contexto individual de cada pessoa.

“O diagnóstico de condições neurológicas e psicológicas como o TDAH é complexo e requer uma análise clínica detalhada que inclui histórico médico, comportamental e cognitivo”, afirma o Dr. Fabiano de Abreu Agrela, pós-PhD em Neurociências licenciado em Biologia, membro da Society for Neuroscience nos Estados Unidos e da Royal Society of Biology no Reino Unido. Segundo ele, padrões de comportamento podem ter várias causas, e diagnosticar uma condição como o TDAH exige muito mais do que apenas identificar alguns sinais em uma lista simplificada.

O papel de quem publica informações

Enquanto consumidores de conteúdo digital, devemos ser mais críticos ao ler postagens nas redes sociais, especialmente quando se trata de saúde. É fundamental buscar fontes confiáveis e, idealmente, consultar um profissional de saúde antes de assumir qualquer diagnóstico. Para quem publica, é de suma importância fornecer o máximo de informações possíveis, deixando claro que cada caso é único e requer uma análise personalizada.

Na era da internet, é fácil se deparar com informações incompletas ou mal interpretadas. Portanto, o papel de quem divulga esses conteúdos vai além de simplesmente informar: deve-se educar, orientar e reforçar que a informação online não substitui a consulta com profissionais especializados.

Em última análise, devemos ser investigadores de nossa própria saúde e ter consciência de que nem tudo o que vemos ou lemos online pode ser tomado como verdade absoluta. É fundamental olhar com ceticismo e procurar profissionais qualificados para obter orientações e diagnósticos adequados.

C/ MF Press Global

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