Todos os anos, cerca de 330 mil crianças nascem prematuras no Brasil e, com isso, vem a necessidade de muitos desses bebês em receber doação de leite humano para sobreviver. Isso porque essas crianças geralmente têm menos de 2,5kg (o que é considerado baixo peso para um recém-nascido) e ficam internados em Unidades de Tratamento Intensivo Neonatal sem poder receber amamentação diretamente do seio da mãe. Assim aconteceu com Gisele Bortolini, que teve complicações na gestação e, por isso, a filha Helena precisou nascer prematura. Durante a internação, Gisele não teve leite suficiente para amamentar e precisou da ajuda dos bancos de leite.

“É muito difícil ser mãe de um bebê que fica na UTI, é uma luta diária pela vida e você aprende a viver o presente, o dia de hoje. E depois de um tempo eu não consegui tirar todo o leite que ela precisava, eu continuei ordenhando e o que eu não conseguia tive apoio do banco de leite. As mães que doaram leite ajudaram a recuperar a Helena em uma fase tão crucial da vida dela”, explica Bortolini.

A pequena Helena teve ajuda de pessoas como a professora Suzi Machado, que começou a doar leite humano quando a filha Laura nasceu há dois meses. “Tem muitas crianças que precisam. Eu tive a Laura em uma casa de parto, que é mais natural, e lá pude ver algumas mães que não conseguiram amamentar. Foi aí que vi a importância de doar, então acaba que a gente que tem muito leite precisa ajudar quem não tem”, defende.

Então, se considerarmos que esse leite é tudo o que uma criança precisa e pode tomar até os seis meses de idade, fica fácil entender a importância desse ato. Para ilustrar melhor esse cuidado tão essencial para a vida de um recém-nascido, é preciso compreender alguns benefícios do aleitamento exclusivo nessa fase, citados pelo Ministério da Saúde como, por exemplo, ajudar a proteger as crianças de diarréias, infecções respiratórias e alergias; reduzir em 13% a mortalidade de crianças menores de 5 anos e mais tarde, em outra etapa da vida, diminuir o risco de desenvolver hipertensão, colesterol alto, diabetes e obesidade.

Apesar de todas essas vantagens, o Brasil registrou redução de 5% no número de doadoras de janeiro a abril deste ano em relação ao mesmo período de 2019. Isso quer dizer que pouco mais de 58 mil mulheres realizaram a doação em 2020. Com isso, o Ministério da Saúde lançou, na terça-feira (19) – Dia Mundial de Doação de Leite Humano, uma campanha para sensibilizar e estimular as doações de leite materno, mesmo durante a atual situação de pandemia por conta da Covid-19. Com o slogan “Doe leite materno. Nessa corrente pela vida, cada gota faz a diferença”, a iniciativa tem objetivo de mobilizar mais mulheres a fazerem a doação e durante todo o ano.

De acordo com a secretária Substituta de Atenção Primária à Saúde do Ministério da Saúde, Daniela Ribeiro, qualquer quantidade de leite pode ajudar. “Dependendo do peso do bebê até 1 ml de leite é suficiente para nutrir o recém-nascido a cada refeição. Cada pote de 300 ml de leite humano pode ajudar até 10 recém-nascidos. O pote não precisa estar cheio para ser levado ao banco de leite humano. Por isso que é importante que as mães, as lactantes possam fazer essa doação”, explicou.

Doação de leite durante a pandemia do Coronavírus

Pelo momento em que o Brasil encontra-se, em meio a pandemia da Covid-19, a orientação do Ministério da Saúde é a de que mulheres saudáveis continuem doando leite, mesmo que o pote não esteja cheio. Cada pote de leite humano pode ajudar até 10 recém-nascidos. É importante tomar alguns cuidados, como: somente doar se estiver saudável, verificar nos postos de coleta e bancos de leite humano a necessidade de agendamento para evitar aglomerações e seguir as orientações para coleta segura. Caso a mulher tenha sintomas de gripe ou morar com alguém que apresente esses sintomas, deverá suspender a doação nesse período.

Lembranças de uma ideia pioneira

E se engana quem pensa que apenas as mulheres se sensibilizam com a situação de risco em que se encontram alguns bebês. José Córdoba Solano, mais conhecido como Zezinho, com sua fala mansa e de sorriso fácil, não esconde a satisfação de, há 38 anos, estar à frente de uma das iniciativas pioneiras de coleta de leite materno no Distrito Federal. Componente do Rotary Club de Taguatinga, Zezinho estimulou outros membros a abraçarem a causa.

“Existiam os bancos de sangue, por que não criar o de leite que é tão importante também? No começo eram muitas dificuldades, as primeiras doadoras foram as esposas dos rotarianos, e precisamos juntar dinheiro para comprarmos uma Kombi para levar as doadoras ao hospital”, relembra. “Foi devagarinho que tudo aconteceu. Mas a nossa alegria é ver a quantidade de crianças que salvamos nesse período”, conclui Zezinho.

Estratégia brasileira

As políticas públicas brasileiras na implantação dos Bancos de Leite Humano e nas estratégias de doação do leite materno são iniciativas pioneiras no mundo e já ajudaram a salvar mais de dois milhões de recém-nascidos. Desta forma, o Brasil possui a maior e mais complexa rede do mundo, sendo referência internacional por utilizar estratégias que aliam baixo custo e alta tecnologia. A Rede Global de Bancos de Leite Humano (RBLH) é uma iniciativa do Ministério da Saúde, por meio do Instituto Fernandes Figueira (IFF/Fiocruz). Ao todo são 224 Bancos de Leite Humano, 217 postos de coleta, além de em alguns estados existir a coleta domiciliar. Além disso, a tecnologia da Rede Brasileira de Banco de Leite Humano foi exportada para 22 países da América Latina, Caribe, Península Ibérica e alguns países da Europa.

As possíveis doadoras podem obter mais informações pelo site saude.gov.br/doacaodeleite ou pelo telefone 136.

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